“Ela acordou do coma e ouviu as mentiras dele… e isso mudou tudo!” »

HISTÓRIAS DA VIDA

Janos caminhou lentamente em direção à enorme porta de vidro de uma clínica privada, escondida no coração da movimentada cidade. Através do barulho das ruas, era como se os sons da vida não chegassem até aqui. Havia ali um silêncio estranho e pesado, em que cada passo que dava no chão de mármore ecoava no seu peito.

Não era a sua primeira visita. Mas, de cada vez que cruzava aquele limiar, sentia nojo: o cheiro dos antissépticos estéreis, o brilho frio e sem alma das lâmpadas, as paredes perfeitamente limpas, como se a própria morte tivesse esterilizado aquele lugar. Tudo ali o lembrava da sua impotência.

Evitou o elevador por princípio: um espaço apertado com ar viciado, paredes espelhadas que refletiam a sua sombra escura e cansada… Não. Uma escada é melhor. Subir lentamente as escadas deu-lhe a ilusão de controlo.

Na mão, Janos segurava um ramo de rosas brancas frescas, uma homenagem quase reflexiva à tradição. Embora soubesse: Eva, a sua mulher, não conseguia ver nem sentir nada há um mês. Aquelas flores não eram para ela. Destinavam-se aos médicos, aos familiares, para apoiar a mentira. Mentiras sobre a sua devoção, sobre o seu sofrimento.

Os corredores receberam-no com uma luz brilhante e implacável. Janos fechou os olhos por um momento, sentindo instintivamente a dor a pulsar na sua cabeça. Ontem foi novamente longe demais: narguilé, cerveja, conversas intermináveis ​​sobre a juventude perdida. Agora cada passo ecoava nas minhas têmporas com um pulso surdo.

Parando em frente à divisória de vidro, pegou automaticamente numa pastilha elástica de menta, mascarando o cheiro a álcool, alisou o cabelo e colocou uma máscara de sofrimento sobre o rosto. Por fora parecia decente. Mas por dentro estava dilacerado pela raiva.

Cada dia da estadia de Eva ali era como um assalto: exames dispendiosos, cuidados 24 horas por dia, procedimentos especiais… Tudo isto esvaziando desesperadamente a sua conta bancária. E tudo isto para quê? Por causa de um cadáver que se recusou a sair completamente?

Quantos mais? — pensou enquanto subia as escadas.

O estado de Eva era estável, mas grave. Os seus pais, Yoka e Istvan, ainda tinham ilusões. O Dr. Bruckner nunca se cansa de falar de “dinâmica positiva”, de “esperança”. Mas Janos não acreditou. Ele acreditava nos números. E ele sabia: se Eva morresse, ele tornar-se-ia o único dono da sua empresa, do seu apartamento, das suas ações. Tudo seria dele. Todos.

Não conseguia sequer pensar em transferi-la para uma clínica mais barata – Yoka ficaria imediatamente desconfiada. Ela tinha um olhar penetrante e penetrante.

Ao aproximar-se da sala, Janos abrandou o passo. A voz do médico vinha de dentro:
— Os últimos dias não foram fáceis. Mas estamos a ver pequenas melhorias. É importante falar com ele, estar presente. Por vezes o amor traz de volta até aqueles que quase partiram…

A voz de Yoki tremeu de lágrimas:
– Doutor… diga-me sinceramente… ela tem alguma hipótese?

Bruckner respondeu diplomaticamente, mas com uma nota de esperança:
– Sim. Há uma hipótese. Não devemos perder a fé.

Janos revirou os olhos, irritado. Toda esta conversa parecia-lhe uma perda de tempo. Mas fez a sua parte.

Quando o médico saiu, Janos entrou. Foi recebido pelas lágrimas de Yoki e pela presença silenciosa e tensa de Istvan. Aproximou-se da cama de Eva e baixou a cabeça, fingindo dor.

Mas, por detrás de tudo isto, ninguém reparou na pequena Hannah – uma menina de oito anos com caracóis castanhos e enormes olhos azuis. Escondeu-se atrás da cortina, segurando o seu ursinho de peluche esfarrapado nos braços.

Ana tornou-se o anjo da guarda da sombra de Eva. À noite, contava histórias, acreditando que a poderia acordar. Ela acreditava em milagres como só as crianças acreditam.

Hoje viu algo que a abalou profundamente.

Janos, pensando que ninguém o podia ouvir, inclinou-se para a indefesa Eva e sibilou entre dentes:
– Vai ficar aqui muito mais tempo, fardo? Não tenho qualquer intenção de perder mais tempo ou dinheiro consigo… Ninguém precisa de si.

Hannah abraçou o ursinho de peluche contra o peito e conteve a respiração. O medo e a determinação acenderam-se no seu pequeno coração.

Quando Janos saiu, ela correu para o consultório do Dr. Bruckner:
– Tio doutor! Tio Doutor! Este tio disse que queria que a tia Eva morresse!

Bruckner empalideceu. Percebeu que não havia tempo a perder.

Examinou Eva imediatamente: o seu pulso tinha mudado. Ela ouviu!

E, de manhã, aconteceu um milagre: Eva abriu os olhos.

Estava rodeada de lágrimas de alegria: Yoka, Istvan, o médico e ao seu lado estava a pequena Hannah com os olhos brilhantes:
– Estava à tua espera… Eu contei-te contos de fadas!

Mas a verdade também estava à espera da sua hora.

Quando Hannah premiu o botão na barriga do urso, a voz de Janos ecoou na sala:

Ninguém precisa de si. Seria melhor se morresse…

O coração de todos afundou.

Eva, ainda fraca, murmurou com dificuldade:
– Ele… mentia o tempo todo…

Yoka apertou-lhe a mão:
– Querida, estamos perto agora. Nós protegê-lo-emos.

Istvan chamou a polícia. Janos não sabia que estavam à sua espera. A sua máscara hipócrita foi arrancada.

Poucos dias depois, quando foi chamado à clínica sob o pretexto de “piora do estado de Eva”, não foi recebido pelos médicos, mas sim pela polícia. O Dr. Bruckner premiu o botão do urso e permitiu-lhe ouvir a gravação.

Janos empalideceu. Foi algemado e nunca mais regressou.

A vida começou lentamente a voltar ao normal.

Eva aprendeu a respirar, a sentir, a amar de novo. Hannah estava sempre por perto — não apenas a rapariga do quarto do outro lado do corredor, mas a sua futura filha.

O Dr. Bruckner, que sempre foi um apoio, tornou-se algo mais com o tempo. A preocupação dela aqueceu os dois.

Um dia, sentada no jardim sob o céu noturno, Eva abraçou Hannah e sussurrou:
– Hannah… queres ser minha filha? Para sempre?

Os olhos da menina brilharam de felicidade:
– Sim! Sim, tia Eva! Para sempre!

Anos mais tarde, o ursinho de peluche estava numa prateleira de uma casa acolhedora, cheia de risos e cheiro a comida assada. Tinha uma placa pregada no peito:

Hannah cresceu feliz e Eva e o Dr. Bruckner tornaram-se uma verdadeira família para ela.

E cada vez que olhava para a sua velha amiga, Hannah sabia:

O maior milagre da vida é o amor que chega quando menos se espera.

Rate article